Na adolescência lia Herman Hesse, o autor de Sidarta e Lobo na Estepe livros que marcaram minha vida de garoto afeito à leitura. Se em Sidarta conheci a vida ascética do jovem andarilho que viria ser o Buda, em o Lobo da Estepe conheci a inteligência de um escritor que analisa a decadência do gênero humano diante da Revolução Industrial e da Primeira Grande Guerra, no início do século XX.
Mas um livro que me tocou ainda mais por sua profundidade não intelectual, mas sensitiva e poética foi a obra Caminhada, também de Hesse. Nele é narrada à história de um jovem andarilho pelas paisagens dos Alpes. A descrição das montanhas, do alimento feito em fogões de pedra e do espírito jovial do personagem me remetiam a um estágio apenas imaginado em minha dura lida de mero professor de escola pública em uma cidade equatorial. Minha realidade me educava no sentido de não desistir e ter a persistência de um Sidarta, ter a fé de um asceta.

Aquelas imagens da torre de uma igreja, da casa de madeira à beira da estrada e do pássaro rasgando o céu sob montanhas nevadas eram para mim visões de um ideal – de um mundo perfeito que algum dia, talvez, tivesse acesso.

Hoje não estou nos Alpes, mas nos Andes em uma região colonizada pelos ancestrais de Herman Hesse. Vejo a velha casa de madeira à margem da estrada, uma igreja protestante com sua cruz como guardiã da fé que não abandonei.

Consegui entender, talvez por caminhos não tão certos, que não é preciso ser o Buda e renunciar a tudo, mas ser grato pela vida, pelos amigos, pelo trabalho, pela memória e, reconhecer nas coisas simples (como dar aula em escola pública na zona equatorial) a ponte para estar aqui, hoje.

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