A primeira impressão é a que menos fica já que teu cabelo de mestiço te convencionou a não assumir tua essência e tua verdade mais profunda.
Trazes na testa a marca do Total e o ver não vê, recolhe poeiras de plásticos, bitucas de cigarro, restos de papel amassado e substâncias orgânicas que geram asco.
Aproxima-te da época que deixarás de comer os restos dos pratos e sentará à direita da mesa e se deleitará com o banquete do Rei.
Tens um brilho essencial herdado do caldeirão das raças sintetizado nas senzalas e uma doçura traduzida em tua voz.
Buscavas respostas em teu próprio País inspirando-te no eco dos igarapés amazônicos, no brilho da asa da arara, na magnética resposta do sol equatorial. Encontrou-os em parte. Mas era preciso mais.
A ânsia ao êxtase acompanha-te desde o nascer do sol. Não queres esperar o meio-dia com sua brutalidade sobre a pele, por isso escapas cedo.
Voas a oito mil pés e do alto vês as cidades diminuídas e a circunferência azulada do mundo toma-as como naves ancoradas na curva.
O grande vale, com três cadeias de montanhas, com três cadeias de montanhas, com três cadeias de montanhas, compõe uma imensa palma de uma samambaia gigantesca. Essas folhas multiplicadas criam um colossal tecido que une Américas com África, Oceania com Ásia e Europa com os mares do norte…
Tens a tua mão, o verbo, a lógica, a fé e pensas que és Deus. Vês a vida dentro e fora, nascendo e morrendo e achas que te edifica construindo prédios arranha-céus de orgulho e vaidade. És um mero e simples viajante que se detém na superficialidade das coisas. Talvez, tua origem paupérrima o empurre para o alto, para que de uma forma ou de outra possa negar tudo aquilo que te falta em essência, mas te sobra em pretensão e arrogância.
Nessa busca da compreensão do Total entras no limiar da Realidade Fantástica, que afronta, arrasa e diminui à condição miserável de matéria tudo o que é palpável, tudo o que é visível e tudo o que é racionalmente perceptível. (São Paulo, janeiro e outubro de 2016)
