Sinto que não faço absolutamente nada
quando não quebro pedra,
ou lambreto minha máquina no asfalto.
Pensar, ler e escrever
são lapsos que meu corpo engendra,
me auto-sabotam e me tomam de assalto.
Cada marretada que dou na matéria,
no poema ou na construção de algo,
com sensibilidade ou ritmo,
cria rasgos, fissuras da força empregada,
sou peão de obra, do andaime alto
voo para o salto.
Pensar em tempos de algoritmo
é o mesmo que cair em emboscada.
Então vou quebrar pedra.
Cada verso ou reportagem que crio,
sinto o cadafalso sob meus pés,
uma guilhotina, um pelotão de fuzilamento
pronta a despencar, pronto a atirar,
mas por obra do acaso ou do destino
erram o alvo e me salvo
por um fio…
Quando penso, quando leio, quando escrevo,
não ouço, não dou a mão, nem salvo ninguém do inferno,
da tristeza ou da dor.
Muito menos aumento as chances de ser amigo de meu traidor.
Então vou quebrar pedra.
Quando a obra se der por acabada,
seja em estilo sóbrio ou elegante
inspirada na escola romântica ou realista
sei que dei ao mundo o impensado
arrancando lá do fundo o que mais amo.
Quando a obra se der por acabada
meus poemas serão tag-ados
e rastreados por sua palavra-chave
identificados por back-links relevantes
e interpretados por apressados, superficiais e ignorantes.
Minhas crônicas otimizadas para o Google analytics
trarão informações de logística
e veneno em spray
para minha alma de poeta
e meu sangue de artista.
Paulo Atzingen, 17/5/2025