Os Martírios povoaram a mente dos brasileiros durante séculos. Sua busca e possível localização seria na época como encontrar o santo graal! Os Martírios eram tão famosos que mesmo os bandeirantes mais proeminentes saíram em sua procura!
por Noé von Atzingen
Aqui peço licença para transcrever o belo e preciso texto da historiadora Maria Virgínia Bastos de Mattos e de Antonio Carlos Bastos de Mattos, que tão bem tratam deste tema. Muito melhor do que eu, que, embora tenha vivido muito por ali, não tenho a capacidade literária dessa dupla!
‘As referências mais antigas às inscrições rupestres da Ilha de Santa Cruz encontram-se nos ” Roteiros dos Martírios” originalmente traçados por membros da Bandeira de André Fernandes, que explorou a região entre 1613 e 1615. Esses roteiros indicavam que em certo trecho da margem esquerda do então denominado rio Paraupava havia vestígios de minérios que aqueles bandeirantes acreditavam ser ouro. Para facilitar a identificação do local, registraram a presença de estranhas inscrições gravadas em rochas, que lhes pareceram semelhantes aos instrumentos do martírio de Jesus Cristo: cruzes, cravos, martelos, coroa de espinhos, lança, escada…
Posteriormente, outros desbravadores tentaram chegar ao local dos “Martírios” mas a imprecisão dos mapas e roteiros e as diferentes denominações dos acidentes geográficos conduziram esses viajantes a outras regiões, principalmente ao Mato Grosso.
A denominação Paraupava aparece pela primeira vez , em documentos referentes à Bandeira chefiada por Antonio de Macedo e Domingos Luiz Grou em 1590 e por várias bandeiras posteriores, ate o ano de 1618. Mas, 50 anos após, a região passou a ser chamada ” Sertão do Goiás I’, e o Rio passou a ser denominado Araguaia, perdeu-se desta maneira a referência do rio Paraupava e do local onde estaria o ouro dos ” martírios”. No século XVIII, as inscrições rupestres do rio Araguaia haviam sido localizadas por bandeirantes e ficaram conhecidas pelo nome de “martírios” no entanto, como não se achou ouro algum, considerou-se não ser ali o verdadeiro “martírios” citados pelos primeiros bandeirantes.
Em 1844 0 viajante francês Francis Castelnau, percorrendo o rio Araguaia, fez um registro pictografico daquele trecho do rio que é conhecido por ” Fecho dos martírios”. Entretanto não fez referência às gravuras rupestres”.
Quarenta e quatro anos depois de Castelnau, em 1888, o cientista alemão Paul Ehrenreich, em viagem pelo rio Araguaia, localizou as gravuras de Santa Cruz. Ele copiou muitas delas e as publicou, mas não houve repercussão, pelo fato de não serem consideradas os “verdadeiros Martirios” No século XX, as atividades do Marechal Rondon chamaram a atenção para o interior do país, suas riquezas ainda desconhecidas, seus habitantes; iniciaram-se, também, as lutas pelos direitos dos povos indígenas. Os “martírios” voltaram a despertar o interesse dos exploradores e de estudiosos . Afinal, em 1 960, o historiador Manoel Rodrigues Ferreira, após exaustivas pesquisas documentais realizadas ao longo de 1 5 anos, esclareceu o mistério que envolvia os “Martírios” , comprovando que as inscrições referidas nos roteiros bandeirantes eram aquelas” situadas atualmente “no município de
São Geraldo do Araguaia, nos pedras do rio Araguaia, no trecho que fora denominado Paraupava pelos primeiros desbravadores. As pesquisas de Manoel Rodrigues Ferreira foram publicadas em dois livros: ” O Mistério do Ouro dos martírios” , em 1960 e ” As Bandeiras do Paraupava ‘l , em 1977. Além disso ele empreendeu em 1971, uma expedição ao local dos ” martírios” e documentou o que viu com fotografias, diapositivos, um filme de 16mm e a reprodução, em gesso, de 50 gravuras rupestres, das quais 17 foram posteriormente gravadas em bronze pela Prefeitura Municipal de São Paulo.
Em 1973, Manoel Rodrigues Ferreira publicou outro livro, ainda sobre o tema, intitulado “Expedição aos martírios”
A IRMANDADE DOS MARTIRIOS
Em 1951, Manoel Rodrigues Ferreira, no livro ‘ Terras e índios do Alto Xingu” , relatou a história de várias pessoas que foram à procura dos ” martírios” Foi a leitura desse livro que inspirou o escritor Francisco Marins a escrever em 1952, ” Expedição aos martírios” seguido de ” Volta à Serra Misteriosa” e ” O bugre do chapéu-de-anta”, trilogia dirigida originalmente para o público infanto-juvenil. Se os muitos livros de aventuras de Francisco Marins encantaram os jovens da segunda metade do século XX, ao lado das obras de Monteiro Lobato, a trilogia referente aos “martírios l’ especialmente, deixaria uma marca profunda em seus pequenos leitores.
Assim como se fala hoje em dia: “filhos de Lobato” – Intelectuais e outros profissionais que se consideram influenciados pelas leituras lobatianas, temos o que Manoel Rodrigues Ferreira denominou ” Irmandade dos Martírios” . Faz parte dessa geração, por exemplo, o geólogo Breno Augusto dos Santos” ” (descobridor do minério de ferro de Carajas), que declarou: ” foi o livro sobre os martírios que me entusiasmou pela geologia e me fez seguir essa profissão” . Também o biólogo Noé von Atzingen, entusiasmou-se pela pesquisa de campo e pela vida em regiões menos exploradas, graças à leitura das aventuras de Tônico, Perova, Pixuira e demais personagens dos livros de Francisco Marins’.
AGRADECIMENTOS
A Virgínia Mattos, por suas sugestões. Ao meu irmão Paulo Atzingen por incentivar essa publicação.
BIBLIOGRAFIA
Gorayeb P.S. de S. 2008. Parque MartiriosAndorinhas: Conhecimento, história e preservação. Edufpa
Como gosto muito de ler,e sou fascinada por esse tipo de trabalho,onde envolve conhecimento,aventura,obstáculos…enfim,amei ler todas essas memórias.
Hoje moro num pedacinho dessa história.
É gratificante ter conhecimento de tudo isso.
É uma viagem no tempo.